QUEM NOS DERA SER BANAIS…
Fugiu-me a leitura correctiva dos meus romances últimos, (Felizmente em Alhadas; As [des]Aventuras de um professor em África e a poesia: Do Amor e da Vida) para a realidade. O tempo, com as personagens que criei e pensei serem bem imaginadas, foi-me adverso. Pensei sempre conseguir umas figuras que fossem uma força dentro do romance, mas… não consegui. Afinal, sendo baseados na realidade, para lá foram, para o que nos é real… estranhamente, penso. Não fui criativo...
Das trezentas e poucas páginas de voltas, com a vida das personagens em cada livro, afinal, estou a rever… o real!… Sentado nesta esplanada de café, ou no seu interior, fugindo à chuva e digamos, agora no Outono, às calamidades próprias destas mudanças rápidas do clima, as personagens estão a passar na rua a todo o instante, falam como no romance, gesticulavam como no romance, riam como no romance, contam histórias suas, como nos romances e cá dentro, ao balcão, pedem café… como no romance…
Acho estes meus romances, muito iguais à realidade… a uma realidade banal. Não são romances épicos como outros, sim banais como todos somos banais. Entretanto são capazes de fazer sorrir ou chorar um intelectual, que ao ler as histórias, demonstre um carinho paternalista, cujo pensamento no momento, redunde em frase: “É tudo tão simples que até como crónica de jornal de província servirá para uma tertúlia…” Ah, o intelectual que analisa assim, dizendo esta frase, não é banal, o intelectual a que me refiro, que sorri e chora com os textos é que é banal, tenho que o dizer.
Penso isso. Porque razão é que a história das pessoas simples, com rasgos de humor, rasgos de bondade, rasgos de heroicidade, rasgos de sacrifícios, de ternura, de dádiva… é banal? Porque razão o aroma de uma rosa é banal? Porque razão o aroma e o sabor de uma maçã de bravo, é banal? Porque razão todos os gritos de angústia são banais? Porque razão os gritos de esperança, são banais? Porque razão os afetos são banais? Porque razão a forma de fazer sexo é banal?
Porque razão se convencionou que a retórica sustentada em demagogias é o futuro? Porque razão se convencionou que um discurso vazio de realidade, sustentado em premissas meramente académicas é o futuro? Porque razão se convencionou que a dinâmica da ficção nunca deve ser simples, sim complexa, baseada numa ideia que interrogue? Porque razão o futuro que nos querem dar, é o presente camuflado, só que não aconteceu ainda?
Porque razão estamos, complexamente, enganados quanto ao futuro? Porque razão já é tão banal apresentarem-nos a incompetência em forma complexa? Porque razão a dor de saber, de pagar, de continuar a sofrer, afinal, é apresentado por esses seres iluminados, é tão simples? Porque razão é banal, neste país ser-se simples? Porque razão a história dos simples, dos seus afectos, do seu amor, dos seus laços de ternura, da sua heroicidade, da sua capacidade de sofrimento é uma forma de pagar, repagar, voltar a pagar os erros clamorosos dos “gestores políticos deste país”, tem que ser banal?
O ser simples, defacto, é banal, e é aceitar o outro tal como é. Ser simples e banal, é ajudar a pagar os erros clamorosos de poucos, para o bem de todos. O ser simples e banal é contribuir para o bem comum. O ser simples e banal é amar, ser amado, ter capacidade de gerar futuro. O ser simples e banal é acreditar, ter esperança e lutar pelo futuro. O ser simples e banal é ser povo.
Ninguém, até que vindo do seio desse povo, pode retirar-lhe a honra e a sua dignidade, quando isso lhe cabe, inteiramente por justiça!
… E as figuras destes novos romances agigantam-se na sua simplicidade. Irei escrever mais e mais sobre as “banalidades” deste povo, é donde sou!
Victor Martins
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