segunda-feira, 6 de maio de 2024

 

AS COISAS QUE EU PENSO...



    Tal como na vida, nada é tão simples como a entrada (nascimento) de um partido, ou coligação, na governação… nada é tão igualmente simples, que a sua “morte” (fora da governação). Simplesmente se nasce e simplesmente… se morre.

    Não vale a pena fugir destas coisas simples, agregando-lhe complicações. É devastador o que fazemos à nossa mente quando ligamos os “complicadores”. Tudo que é simples está transformado num “colossal desvio”. Redunda sempre em dor. Ou porque não temos capacidade para dar seguimento à solução das coisas, ou porque o caminho seguiu tal capricho que a solução encontrada passa para lá do problema que criámos ao termos agregado às coisas simples a complicada forma de estarmos na vida (também política).

    Ser grande, acima de toda esta bagunça partidária, e quiçá da vida, significa que se sintetizou tudo. Ser sábio, significa que a síntese que criámos para as coisas, resolve tudo de forma cabal e a usamos no nosso dia-a-dia. Ser simples significa ser sábio e ser grande.

    Agora, com esta esmerada situação política, é um Deus nos acuda! O Deus que criámos tem várias formas. A pior imagem de todas é o Deus complexo, que está sempre com a “espada” da justiça na mão pronto a exercer tudo o que criámos para essa imagem, e a castrar-nos (não se “estiquem”, entenda-se Justiça Divina). Mas, vamos ponderar sobre as burradas que fazemos, o Deus que está adjacente à complicada forma de o vermos e sentirmos, não é complicado. É simples. É, e será eternamente simples. Ele é capaz de sintetizar a vida, as coisas da vida, e usar essa síntese em prol de todos. Mas o que é Deus que estamos sempre a clamar, sim porque quando as coisas correm bem, Ele não é tido nem achado na nossa vida, pergunto então, o que é Deus? Que conceito temos de Deus. É a complexidade da vida resolvida a contento? É a simplicidade solucionada e que flui de forma cristalina? Quando demos conta da sua existência? Quando é que ele nos assistiu? Na complexidade? Na simplicidade? Na dor da complexidade? No sorrir da simplicidade?

    A regra número um, a natural, da vida: é a não ocupação do espaço que o outro ocupa, porque possui volume visível e ponderável, tal como o nosso.

    A número dois? Começámos por criá-la, e a número três, a numero quatro; regras atrás de regras, até porque ao termos ponderabilidade, tínhamos que ordenar essa forma de estar no mundo. Começámos por nos separar da natureza porque o nosso pensamento conseguiu desligar-se do corpo, mas não na totalidade. Se o corpo não tiver os mínimos satisfeitos à sua sobrevivência humana, o pensamento jamais se separará do que é terreno. Logo não pensa e pouco existe. O ser-se humano, cujo conceito assenta na capacidade de nos separarmos da natureza, perde-se, por vezes por forma definitiva, passando a sermos uma parte móvel no planeta, sem que nos assista o direito ao que quer que seja por não conseguirmos reivindicar nada do que é nosso por direito, como seres humanos. Não o conseguimos fazer por não termos essa noção.

    Mas a nossa separação, do que nos é natural, levou-nos a criar um mundo para todos. Aqui, as regras, por mal elaboradas, conseguiram deturpar o principio simples da coexistência e divisão de recursos. Entrámos a ditar complexidade às coisas simples. As coisas simples, por isso, não o são na esmagadora maioria dos momentos da vida.

    Deixámos de ser grandes, deixámos de ser sábios, passámos a ser mutantes do que a natureza pretendia. A natureza é a simplicidade das coisas. Ela ouve… escuta… mas segue sempre. Ela é Deus. E Deus é simples, não é complexo e não castiga. Deixa-nos o trabalho de cuidarmos de todos para que a simplicidade seja o nosso mote.

    Mas não, somos complexos, desvirtuamos o simples, ligamos “sempre os complicadores” justificando essa nossa atitude. Criamos em nosso redor seres que deixaram de pensar porque o corpo não satisfeito não os deixa separar do pensamento. Simplesmente o amarfanha, silencia-o.

Estamos a criar um povo de mutantes que com braços caídos, andam de rua em rua, como autómatos à procura da simplicidade dentro da complexidade pois é esta a vontade dos governantes. Complexidade sobre complexidade. Até quando?

Comecemos por criar locais de debate entre seres humanos. Sejamos simples! Mostremos que a complexidade pode ser desmontada. Façamos isso em nosso nome, em nome das gerações futuras, mas, ponto de honra, em nosso nome!

As gerações futuras que ainda dependem de nós, irão agradecer e estarão à espera das nossas soluções!

Sugestão: 1º Tema – Porque razão voto sempre no mesmo partido?

2º Tema – Como posso contribuir para remodelar a estrutura dos partidos?

3º Tema - Como criar, ou garantir competências nos futuros candidatos à governação, de estado ou de municípios?

    Penso assim… Valerá a pena pensar assim? Dir-me-ão.



Victor Martins

sábado, 4 de maio de 2024

 

JÁ NÃO ROÇO MAIS MATO…

 

 

 

Olhando para o estado de coisas a que se chegou e que o novo governo alardeia, queixando-se de “barriga cheia” deixada pelo governo anterior, verificamos que graça a incompetência e se vislumbra, por já ter começado, uma destruição de valores e de, enfim, conquistas, conseguidos muito a custo, através de muito esforço financeiro, intelectual e de vontades do cidadão que não esperava por este estado de coisas.

          O dito esforço que conseguiu, por exemplo, um serviço de saúde, verdadeiramente necessário ao bem-estar do cidadão...

          Os tempos são outros e as perdas das possessões noutros continentes, levaram a quedas económicas e financeiras no nosso país, cujos governos nunca conseguiram levantar a nossa economia. A manutenção de arcaicos sistemas políticos, económico-financeiros, prática sistemática dos vários grupos políticos que nos governaram, tinha que levar a um fracasso claro, acrescentado a isso, ainda, um sangramento do país, tudo para conseguirem umas mordomias, aposentadorias ou acumulações de remunerações várias, conforme os cargos exercidos em “prol do povo”.

          É claro que o capitalismo de casino desenfreou através do mundo todo, dando aos povos uma nova forma de escravatura.

Como se pode produzir a um preço que dê dignidade ao “operário”, se nos países emergentes esse preço/salário é miseravelmente escravizador e os produtos seus são os que nos aparecem por cá?

A China clama aos quatro ventos que tem direito a ter uma opinião a nível social e económico como todas as nações e nada faz para a estabilização dos mercados financeiros porque sub-repticiamente tem entrado na economia dos países, assenhorando-se do que lhes pode “comprar” e agora reclama esse “património” que nunca foi deles, clamando para uma estabilização que não lhe “estrague” a entrada dominante nesses países? EDP… mais alguma coisa?

          Nós, com o nosso fraco poder económico e financeiro, aliciados pelo “facilitismo europeu” (vinda de €€€), caímos nestas malhas, é lá que vamos comprar, nas suas lojas, e duas vezes, porque o material é tão, mas tão mau, e perigoso, que vai ter que sempre ser comprado duas vezes porque não tem qualidade. A quantidade de tralha que nos vendem, de plástico e de coisas que não têm interesse nenhum é abismal.

          Experimentem reclamar aos vendedores chineses sobre os dois anos que todos os produtos têm que possuir de garantia. Zero. Legislação europeia não cumprida… comprei agora um telemóvel… bom não consigo reclamar que não tem som ao aliexpress pois foi nessa megaloja… (vigarice?) que comprei.

          É lógico que também os especuladores tomaram conta dos estados. Os políticos, nas suas vaidosas “fotografias de família”, futuramente, ou não, para mostrar aos amigos como são importantes no seu país, deixaram o nosso país cair nesta situação… até nos dão “aulas” quando nos informam que nos vão dar o que é nosso. Impostos, scuts, escalões do irs, vencimentos, pensões… que sei eu.

          Nós, que sempre lutámos por tudo o que temos, digo tínhamos, porque, como estou na classe dos que têm um pouco mais que mil euros, iremos pagar tudo, até que o perder a capacidade de honrar os nossos compromissos se verifique.

          Como nos envergonham “chorando” sobre o “excedente” orçamental, neste recente caso, dizendo que o “menino” anterior disse que lhe “emprestava o comboio” e agora “não tem o comboio”. Ainda por cima todos estamos a ver o “comboio”. Será possível esta lamúria? Tanta incompetência? Estamos “tramados”. Sempre para pior!

          Tal como se lê no romance… “Quando os lobos uivam…” passaremos a lamentar, dizendo: “Já não roço mais mato… levam-mo todo! Puta que os pariu!”


Victor Martins

 

Esta e outras publicadas neste blogue, encontram-se já em livro, com o título " As (des)Aventuras de um professor em África"


A “CHITA”



          - Esta história que vamos contar…

          - Vais, porque só a ouvi, tal como tu… bom... na parte primeira da história, também foste protagonista.

          Carlos tinha sido interrompido por António. Retomou a conversa…

          - Tens razão… a primeira parte desta história passou-se, também, comigo…

          - Não é preciso ficares com essa cara. Já lá vão quase… quê?... muitos... quantos anos?

          - Mais ou menos, coisa e tal. Não interessa agora – Responde Carlos e continua – Penso que é assim, no seu todo... Mas... lembro-me do que aconteceu quando fiz parte da primeira investida do grupo e… sinceramente podia dar em grave tragédia, pese embora o mau que aconteceu ao… fico sempre, digamos que “arrepiado” ...

          - Mas conta, os leitores vão interessar-se por esta história… mais uma entre muitas…

          - Está bem, menino António. Cá vai. Tínhamos combinado ir à caça da Chita, eu, o Borges, o Franklin, o Celso, o Carvalho, o meu colega de escola, queria ir, mas quase sempre rumava a Sá da Bandeira... o Celso entrava pela primeira vez no grupo, era da Ganda, tinha aquela casa de tintas e materiais de construção, era muito amigo do Borges, o dono da oficina de reparações automóvel, e, também do Franklin…

          - Claro que me lembro dele. Um “acelerado”, sempre a mandar bocas, bom homem… ao seu jeito, mas estoira vergas, não era?

          - Era, António. Difícil de lhe estabelecer regras, como as que tínhamos na caça. Fomos para as bandas de Capira, tinham-nos dito que muitas Chitas por lá havia… lembrei-me do “grande lago”, aquela enorme porção de água que era “abastecida” por alguns riachos e uma forte nascente de água, a que dava origem ao rio Cubal. Seguia até à Catumbela, onde entrava no rio com o nome do local, Catumbela. Vê a nascente... tenho aqui a fotografia aérea do local...

                    

          Ora o nosso “pacaça”, o Land Rover cor cinzenta, como quase todos os jipes da “praça”, estava todo reparadinho, lustroso e a trabalhar que era um “mimo”. Seguimos em direção ao destino. Uma hora da manhã de um sábado. Mantimentos, as duas 375, a Parker e a Winchester e a S&W, velhinha (smith & wesson) com munições 300 Magnum. Estas munições não eram do tipo perfurante, sim destinadas a impacto, rombas, mais por causa dos elefantes, pacaças… enfim… nunca matámos nenhuma “peça com trombas” ou alguma “chifruda” com mais de 100Kg, que “necessitasse” da S&W. Mas era muito “digna” a presença dela no nosso grupo.

          O ar era fresco. A cerca de 30 quilómetros avistamos uma manada de galengues. Cerca de 10. Maravilhosos ruminantes. Mas, não era isto que nos interessava, sim o felino mais rápido a “funcionar” em Angola, e outras paragens, a chita. A minha velha “zeiss icon” tirou mais uns slidezitos à manada e lá continuámos para sul.

          - A Chita chega a atingir os 100 quilómetros por hora, não é?

          - Chega, dizem os entendidos na matéria que já provaram isso com os radares próprios para isso, bom, mas a vegetação que se via era a típica da zona. Eram árvores de médio porte nesta área, entre os dois e os cinco metros, com muita e muita terra entre elas mostrando o vermelho típico de uma terra “ferrosa” ... normal... muita espinheira, embondeiros espalhados pelo terreno, capim baixo a bordejar a estrada, picada boa, diga-se de passagem, sem regueiras provocadas pelas chuvas que levam os veículos a trepidarem de uma forma desesperante, e aquele pozinho teimando em levantar à frente do “pacaça”. Estava vento. Tudo a tossir de leve... e a beber água. Esta ia com fartura...

          Muitos e muitos quilómetros percorridos e começámos a dar conta que nos íamos aproximando da zona da “nascente” do rio Cubal, no grande lago, (por mim designado, entenda-se) porque a vegetação era agora mais densa e mais verde e o ar mais fresco. Enveredámos, saindo da picada principal, por uma bem mais complicada, em direção ao “lago”. Vimos no ar muitas aves o que nos “dizia” estarmos perto. O sol começava a aquecer o ambiente. Parámos perto do rio. Cada um tratou das suas tarefas... experimentar armas, sem tiro é claro, ver os mantimentos, e esticar as pernas.

          O Borges relembrou o que lhe tinha sido informado, falando para todos, e, conhecedor da área bem como o Franklin, com todos prontos, colocaram os dois, Borges e Franklin, as armas ao ombro, (confesso que nunca tinha visto esta forma de tratar as armas, vindo logo deles) agarradas pelo cano e seguiram, à frente, rumo à “nascente” do rio. O Celso pegou rapidamente na Parker, a “derradeira” e eu, olha, segui de “mãos nos bolsos a assobiar uma valsa”. Este Celso é um abusador, ia pensando atrás dele. Quem lhe disse que podia levar a arma?... Sentia-me completamente inútil... A arma não era a minha... a minha era uma caçadeira de 77 de cano, canos paralelos, uma Liege... Claro que não servia para nada nestas circunstâncias, nem com zagalote nos cartuchos, mas... enfim, ao menos se a tivesse trazido sempre “aconchegava” o ego.  

          Andámos dois ou três quilómetros mesmo assim, o suficiente para estarmos cansados por causa da viagem e do ato e pedras a ter que passar. Sentámo-nos numas, junto a uma fileira de árvores que circundavam umas “paredes” formadas por maciços de pedra... pareciam cortadas para fazer o tal muro. Estas pedras, eram curiosamente modeladas, pelo que parecia, por “agua” e agentes atmosféricos. Tinham imensas cavidades tipo bolsas, denotando pressão constante de água durante milhares de anos e na parte superior eram largas, com, aí uns dois metros, mas com fendas pelas vertentes, partidas, digamos, talvez por excessos de temperatura e arrefecimentos rápidos. Era uma fila seguida, com cerca de quarenta metros de comprimento, por uns 3 de altura. Muitas das árvores, atrás e algumas na frente, pousavam os ramos sobre elas. Um bom esconderijo para aves e animais de pequeno porte...

          Levantámo-nos e, claro, predispus-me a seguir a brigada que chefiava o grupo... Ao menos podia ter trazido um bloco para ir “apontando alguma coisa”. Pensava. Bom, tinha a maquineta com um rolo, só com 6 fotos tiradas.  Era de 24 slides e ainda tinha outro intacto... os dois eram Agfa porque privilegiavam os tons azuis e verdes, eram melhores em paisagem que os Kodak. Estes davam mais ênfase aos tons quentes, vermelhos, amarelos...

          Para lá da metade, quase no final do “maciço” de pedras, Borges e o Franklin ficam de cócoras rapidamente.  Baixei-me também. O Celso ficou em pé a olhar para o local onde estavam os dois, mais à frente, e a tentar ver sobre as pedras o que poderia ser. Leva a arma acima e espreita pelo óculo. Lá na frente, gestos para nos baixarmos, mais para o Celso, porque eu já estava e não tinha condições para fazer o que quer que fosse. O Celso baixa-se, mas volta a levantar-se. O Borges mandava-o baixar com uns gestos que se veriam a 200 metros. Afasto-me um pouco para a direita da barreira de pedra que estava à nossa esquerda, por forma a poder ver o que se passava.

          Vejo três chitas. Uma é um filhote. Só oiço um tiro, um rosnado enorme de raiva de uma chita. Era o macho e um restolhar sobre as pedras com os ramos a abanarem progressivamente na nossa direção. Dois tiros são ouvidos e os animais desaparecem.

          Borges e Franklin tinham atirado para o topo das pedras para afastar o macho que “voava” na direção do Celso... e da minha.

          Foi o fim do mundo. O Borges e o Franklin desancam o Celso de tudo quanto era nome chamando-o, agora em português mais “legível”, de irresponsável que não fazia a mínima ideia do que era caçar, que podia ter posto em perigo a sua pessoa e a minha e que se não tivessem disparado para afugentar o animal tinha-se dado uma tragédia. Foi ele que atirou à revelia... sabia as regras e não as cumpriu. Só a ganância da peça....

          O Celso não conseguia engolir aquela “desanca”, e ia respondendo. Entretanto fomos dar uma volta pelo local e soubemos que quem tinha sido baleado pelo dizer do Celso era a cria... de raspão, pelo menos a julgar pelo pouco sangue que se via no chão.... Continuámos a seguir o rastro e trezentos metros mais à frente, sob uma pedra, o casal... a cria esta deitada.... Tínhamos ali o resultado da precipitação. Celso avança para ir buscar o animal. Borges e Franklin correm atrás dele, deitam-lhe a mão à casaca de caça e viram-no para eles. Borges diz-lhe com a cara quase em cima da dele e de punho pronto...

          - Já fizeste uma linda coisa, agora querias morrer. Ficas aqui já! Voltas para trás connosco. Entretanto Franklin com a arma pronta a disparar estava expectante. Mantinha o casal de chita sobre mira.... Só se viam, agora, parte das orelhas do macho e parte do focinho. A cria à vista, mas os progenitores atentos ao nosso grupo.... Olhavam para nós. O macho rosnou novamente de uma forma furiosa que nos fez voltar para trás a “passo de corrida”.

          Já no jipe e a caminho de casa, com uma viagem inútil como base de humor, e uma tensão algo desconfortável, Franklin lembrou a Celso.

          - Celso, sabias que não devias disparar sem que estivéssemos prontos e em situação resguardada. A chita não é nenhuma cabra de leque, não é um galengue, um gnu... é perigosíssima quando ferida. Quando isso acontece vai atacar nos próximos minutos com toda a certeza. Esconde-se e ataca sem se dar conta dela. Mataste a cria e viste que ela ia atacar se não fosse a pronta atuação, minha e do Borges,  atacava-te e eventualmente ao António. Nunca mais faças isto!

          Franklin diz-lhe:

          - Vais desculpar, mas mais uma destas e o teu pedido de ingressar o nosso grupo fica sem efeito! Que ganância!

          Seguiu-se um silêncio de quilómetros... Para desanuviar o ambiente, Borges e Franklim começam a traçar novos projetos. Seria para os lados da saída do Cubal para Benguela, antes do entroncamento com a estrada que vem do sul. O soba da sanzala... agora não me lembro do nome... ficava para o lado da captação de água... Bom, o soba tinha pedido um galengue ou cabras, para uma festa de casamento que ia acontecer daí a quinze dias. O relacionamento entre o Franklin, mais que o Borges, com os sobas da região, era excelente. Franklin, dono de uma fazenda de sisal cuidava dos seus trabalhadores como poucos. O Matos já não era tanto assim, embora nada faltasse aos trabalhadores, sabíamos isso tudo, pelos próprios trabalhadores.

          - Deixa-me perguntar Tó, o Matos fazia parte do grupo, mas ia poucas vezes convosco?

          - Ia... tinha afazeres que o Franklin não tinha. O pai do Franklin era quem dirigia a fazenda, e por isso estava muito mais “solto”. Tanto que dava física na D. João II. Era meu colega. Mas, com esta peripécia, passaram-se cerca de 8 dias, até que, um dia, estávamos no café, eu, tu, o Valentim, o Sousa e aparece o Borges com cara de quem está maldisposto. O Valentim, bem ao seu jeito, dispara:

          - Ó Borges, estávamos aqui a pensar em te debitar esta despesa, mas como vens aí, podes pagar diretamente ao balcão, embora estejas com cara de quem não está para aí virado.

          - Pago sim senhor. Mas a minha cara tem a ver... - Sentou-se e pediu uma Cuca. Virou-se para nós e diz.... Pois é, avisei ou não avisei o Celso para não tornar a fazer asneiras? - Olhámos um para o outro, estás lembrado? Pois foi outra vez ao local, agora com dois fulanos seus vizinhos na Ganda.

          Desencostámo-nos automaticamente dos bancos... Borges continuou...

          No sitio onde atirou sobre a cria, e no meio dos dois companheiros a chita, presume-se que o macho, só podia ter sido, saltou-lhe em cima, rasgou-lhe parte da cara e do ombro... O animal falhou porque, por milagre, o Celso tinha-se virado no momento para perguntar qualquer coisas aos outros. Bom, vieram a “voar” para a Ganda, o jipe gripou à entrada do hospital, seguiram para Nova Lisboa e já foi para Luanda... Tem necessidade de uma cirurgia muito complicada e disseram-me que o olho fica comprometido. Não morreu por milagre, tanto sangue perdeu...

          Tinha dito àquele palerma que não podia brincar com este tipo de animal. A ver se não foi direitinho a ele?!!!... há “gajos” que não ouvem ninguém!

- Agora, estás calado! Claro António, não é para menos... - Digo para Carlos.

    - Vês que afinal, os anos passam, mas o peso do que acontece não desaparece assim.

     - É melhor não pensarmos mais nisto e despedirmo-nos com um até breve.

 

 

 

Victor Martins

terça-feira, 20 de fevereiro de 2024

 

POLITICAMENTE A FAVOR DO PAÍS…

VOTA-SE EM CONSCIÊNCIA OU NÃO?



É natural para quem escreve umas quantas linhas em prosa, fazer pausas nessa escrita. Vários são os motivos. O que preside a esta, está sustentada na análise da tomada de decisões que reinam na política do momento: Vota-se ou não queremos ter futuro?

Conheço pouco dos meandros da política e das suas variáveis complexas, mas sei que o “decidir”, não tem um valor assim tão grande senão o de suportar a auto estima de quem sempre decidiu e em muitos casos, a clientela que o sustenta; a confiança que temos na nossa força de decidir, por vezes, dependendo do resultado mau ou bom, mesmo assim, é o que nos permite continuar a viver. Parece, por prática de observação e vivência dos resultados políticos na sociedade, que tanto faz uma ponderação apurada para decidir sobre uma determinada tarefa a executar, ou atirar uma moeda ao ar, é o mesmo.

Damos conta que algum sector do povo pretende sempre novidades, mas sem responsabilidades inerentes ao assumir essa mesma novidade. Chega-se a isto. É que gostamos de “lançar as perdizes” para ver os outros terem que “andar aos tiros” com essa nossa atitude. Se nos for perguntado onde vimos as “perdizes”, ou porque razão o fizemos: “Não sabemos, não respondemos, ou viramos as costas.”

A democracia, o nosso sistema democrático, entrou no que Maquiavel escreveu sobre o “que é” a política, e já nessa altura. Descreveu a política como era e não como deveria ser. Então a democracia deveria ser... mas não é! Com a nossa forma de ver e praticar a democracia, confiamos nos aspirantes a democratas, votando numa “copy & paste” ideológica que, mediante o que nos proporcionou o dia de trabalho, subscrevemo-la, sem sequer vislumbrarmos que esses “condutores aspirantes” a democratas, nos levam a criar um “opressor ideológico”. Somos pela novidade? Os que já são “entardecidos” na política não possuem saber acumulado? Nós os novos, somos intelectualmente e unicamente de “geração espontânea”? As nossas más escolhas nas eleições, continuam sustentadas na teoria real de mantermos as “asneiras” para que não nos critiquem negativamente e estarmos minimamente de acordo com os opositores?

Democracia é um sistema que se fundamenta na relação do homem com o bem-estar social, nunca da relação do homem com o homem. A regeneração deste sistema político deve ser feita com base em fundamentos da essência da coisa social; procurar que o poder seja sempre uma origem, nunca que seja a “origem” dos caprichos e interesses individuais, de um grupo, um partido ou um homem.

Na democracia, o político nunca deve ser a fonte, simplesmente o canal necessário ao transporte das coisas do interesse publico, e que, dado o lugar em que foi colocado, nenhuma autoridade sem ele, mas, nunca, nenhuma autoridade provinda dele.

O relacionamento entre pares, tem que ser permanentemente feito com entendimentos. Se não for assim os consensos perdem-se. Se isso acontece, nessa altura, os partidos passam a designarem-se por “Bandos”.

Nunca se deverá instalar o poder das maiorias no sistema de governação. Se isso acontecer levará à criação de resultados que não interessam socialmente a todos. No sistema onde o poder é repartido, numa democracia, que não a dos interesses, os consensos são importantes para bem da própria democracia e se é assim, do bem-estar social. Seja, aqui as resoluções são coincidentes com a razão e com os fins últimos da nossa sociedade.

Como começar um novo ciclo com alguns a prometerem “perturbar”, com razões ínvias, a estabilidade desta “quinta” que até possui um “regulador fora de portas”, lá na tal UE, que pretende objetivos cumpridos para que o bem-estar da sociedade continue? Vamos ser responsáveis e chamar a “terreiro” quem nos representa para que o país possa ser governado, ou... vamos dar largas à nossa frustração por sermos uma dezena de milhão, erguer as bandeiras das cores partidárias numa guerra estúpida e ir em busca de “pólvora” para lançarmos o caos sobre os que sempre trabalharam e pagam para que exista paz, progresso e democracia plena, sobre nós, ao fim e ao cabo?

Analisemos quem são os que não querem o país estável. Saiamos dos “clubes” e pondere-se, caso a caso, sem facciosismos “clubistas”. Se calhar chegamos à conclusão que somos afinal, um povo empreendedorista, criador de empregos que sendo a riqueza criada, bem administrada, esses empregos podem ser bem remunerados em todos os quadrantes profissionais.


quinta-feira, 18 de janeiro de 2024

 

A VOLTA


    Hoje decidi, apesar do adiantado da hora, andar pela cidade. São 21 horas e 30 minutos… Fiquei assim, sem ter a certeza do que queria. Depois de um dia extraordinariamente medíocre não me consegui ver ao espelho, que é como quem diz, ter a distinta lata de me introspectar e verificar até que ponto chego. Parece que tudo me assalta nestes dias maus... O assalto desta vez vem com a interrogação sobre o que faço, ou que fiz… Cá para mim, cumprir escrupulosamente a rotina é ser bom funcionário, mas… não é verdade. Vir para casa com a consciência do dever cumprido só porque cumpri o trabalho rotineiro… não é de bom trabalhador. Apesar de não ter uma chefia à altura, esse é um dos grandes males da nossa sociedade, é claramente, possuir uma má chefia, a estagnação de muitos serviços ou até a degradação lenta dos mesmos, ou de outros, mas dizia, tenho a obrigação de virar o processo. Tenho a obrigação porque me considero competente, na teoria e na prática demonstrada em ocasiões, não a tempo inteiro… assim não teria o privilégio de dizer, nesses dias de maior aperto, que estou estafado e que o que ganho não é de modo nenhum a correspondência do que produzo… Apetecia-me agora dar uma gargalhada pelo que disse, não fora o grilo falante que me atormenta o ouvido, e, gargalhava mesmo…

    O tempo, nesta noite é frio e chove, mas a intervalos. De vez em quando nota-se que as nuvens vão e deixam clareiras, mas o vento volta a trazer outras e lá cai mais uma quanta água.

Não levo chapéu… levo chapéu… de momento ao sair, junto do minúsculo quadrado de jardim que me cabe por ter aquele andar, olho para o céu. Está limpo… Umas nuvens mais afastadas não vão de certeza vir tão depressa, até porque o vento abrandou. Entre o ir à mala do carro e sair sem chapéu de chuva, optei por ir sem chapéu, até porque assim sempre aumentaria o meu divagar, ao ter que me abrigar debaixo de qualquer árvore, beirado, varanda, ou simples entrada de um centro comercial… quem sabe se não um café… mas penso que não, não estou para ir para um café pois não me apetece estar com muita gente, o silêncio da noite no meio de tantos é o melhor tratamento para a depressão… ou consciência pesada… ou consciência disso!...

    Não me coube nenhuma mágoa no dia de hoje, no anterior ou nos antecedentes. Simplesmente dei comigo a refletir sobre o meu desempenho, o que faço para melhorar o rendimento no meu posto de trabalho, o aumento de produção que pode ter a minha firma derivado do meu empenho… A consciência de ser um elo útil na cadeia produtiva e consequentemente o meu país a ganhar com isso. Hei! Ainda bem que estou a pensar! Calcule meu caro Pedro, que o senhor estava a falar alto no seu serviço, ou na rua? Na rua eram capazes de nem ouvir, ou se ouvisse alguém, de pensar que sou maluquinho e falo sozinho… isto porque toda a gente dá conta e distingue se um cidadão fala com os seus botões ou se está a falar a um telemóvel. No serviço, tínhamos caso. Ou seja, eram bem capazes de me olhar de soslaio e pensarem que estaria numa de agradar às chefias, ou a querer lixar os colegas porque, apresentar mais serviço que os outros é muito mau para todos.

    Estou simplesmente num fim de dia e de semana que nem sei porque estou assim. Nem sequer houve nenhum acontecimento na firma que desse lugar a este meu problema “existencial”… Que eu dê conta…

    Apetece-me simplesmente andar, mesmo que o dia esteja frio e chuvoso. À entrada, ou saída, depende da circunstância, do meu prédio, olho para o vazio, mas tenho que me por em marcha porque já disse umas 5 ou 6 vezes, boa-noite aos vizinhos que entraram… ou saíram?... O melhor é começar a entrar na noite e na rua, não vá algum vizinho sair e começar a olhar para mim com ar interrogativo. Não é que isso me importe, mas, não vale a pena dar azo a comentários de espécie alguma. Quero dizer… Não me importo, mas estou a importar-me. Isto é que é coerência!

    Começo a andar pela rua depois de ter encostado o pequeno portão que separa a entrada do prédio da rua. Uns seis metros, que são suavizados com uma escada de três degraus, até ao pequeno patamar de saída… onde o portão “trabalha”. Subo a gola do meu “kispo” porque afinal o vento está fresco. Não vou mesmo buscar o chapéu, até porque as nuvens continuam bem longe.

Entro numa rua de movimento… deslizo para o lado de um centro comercial, mas vou para o outro lado da rua, onde as arcadas do prédio enorme, ao longo de 200 metros, me encobrem… sabe-se lá de quê. Hoje estou assim. A não querer conversas, nem ver, nem ser visto. Vou andando com passo lento, não demasiado para não dar a entender que estou a passear a minha má consciência a esta hora… Lá estou eu a ter problemas com o que possam ou não pensar, comentar, ou sorrir, os outros… Preconceito cretino! Idiossincrasias… problemas para psiquiatria resolver, que sei eu?... O certo é que não pretendo dar a entender… Isto está bonito! Sim senhor! Ou seja, os males que muita gente tem? Quer dizer… será que têm? Ao que a experiência de vida me mostra, é verdade. Todos temos, ou enfermamos temporariamente deste mal. Mas não devem ter este tocar a rebate no espírito. Que pensamentos estes. Porque razão tinha que me acontecer semelhante coisa... Ao que me consta, os outros parceiros não os relevam. Matam.

Esta minha consciência, é uma espécie de sogra… que me desculpem as sogras, algumas, mas, a sua permanência nas nossas vidas, nunca mais acaba.

    Bom, a esta hora queria estar com o cérebro como muitos cidadãos o têm. Vazio. Mas não consigo. Apesar considerar, depois disto, que a mulher pode ir para todo o lado, desde que não seja connosco, queria tê-la presente para poder debater com ela este conflito com que me presenteou. Sim, o não conseguir admitir que estamos num comboio onde somos acionistas, cobradores, condutores, passageiros, planeadores dos trajetos, mas agora, demos conta que afinal o trajeto não presta. Não nos leva onde pensávamos, onde determinámos que fosse, onde terminava um dos objetivos de vida. Servir de exemplo aos nossos filhos, verem que existe a possibilidade de terem sempre uma estação melhor que a nossa inicial, como seu ponto de partida e poderem planear os trajetos a caminho da sua realização, como seres sociais de uma cadeia que se pretende mundial.

    Começo a ver, ao longo do percurso que tomo, que afinal o grilo falante tem fundamento, no desaire que foi o “nosso projeto”! Que projeto foi e quando? O ter querido ser, afinal o quê? Rigorosamente certo! Sim, mas, agora não entendo. Era ser, ou ter projeto? O que estava escrito no nosso projeto, quer dizer, nosso, bom, de alguns que afinal entraram nele…

    Tinha como base o progredir-se como seres humanos, em família… nesta sociedade, no país, para que graças a essa progressão, seja, poder participar para que outros que não conseguem ter tantas hipóteses, possam ter dignidade no viver diário e conseguirem, posteriormente, ajudar igualmente, através de incentivos nossos à sua produtividade integrando assim o coletivo nacional. É claro que não é possível ajudar constantemente cidadãos que vivem só de ajudas e não pretendem colaborar para o bem coletivo com a força do seu trabalho e depois, em evolução, a força do seu empenho e intelectualidade possível.

    Comecei a não ser “solidário”, dirão alguns, ou diriam se me ouvissem o pensamento. Quantas vezes alguns destes cidadãos vêm a terreiro com a frase da necessidade de diálogo? São apoiados por alguns que em cima de um palanque legal reclamam o diálogo. Só que nesse dialogar, dizem efetivamente o que querem e não suportam, ah, até nem ouvem, o que os outros pensam e reclamam. Com estes só o eco consegue a última palavra

    Continuo rua abaixo, agora a entrar numa zona onde uma rotunda está a ser reconstruida, enorme que só visto… exigências arquiteturais. Parecem-me apertadas as circulares que levam a outras ruas. Um caminhão a manobrar aqui não consegue virar, sem ter que subir os passeios… Claro que ninguém quer saber se eu quiser mudar de casa, que vou ter necessidade de um caminhão que me trate da mudança… Enfim, não é que ser arquiteto paisagista faz doer a cabeça?

    Está a chover outra vez. Vinha distraído com estes pensamentos que nem dei conta que me estava a molhar, mas isto de arejar as ideias, dá dores de cabeça também, entretanto, nestas alturas, ninguém está connosco neste “nosso estar”. O certo é que queremos estar sozinhos… O que nos foi acontecer. Bom, agora tenho que correr para baixo de uma varanda larga, aliás onde já se encontra um cidadão que também sacode o casaco e resmunga qualquer coisa.

    Já encostado à parede, porque a chuva vem inclinada, trazida pelo vento, levo a mão ao cabelo e tenho uma exclamação de contrariedade o que leva o meu companheiro de lugar a exclamar:

    - Meu amigo, esta noite está muito esquisita. Ora não se vê nuvem, ora temo-las todas a despejar uma imensidão de água… isto está jeitoso a começar o ano. Água não vai faltar com certeza.

    Arrisquei:

    - Com tanta água que os nossos dirigentes…

    - Tem toda a razão! - Atalha o meu vizinho de “pala”. A água é tanta que tem que sair por algum lado! E saiu! É triste mas é uma verdade incontestável. Não é mais possível continuar com este tipo de pessoas à frente de um país! Não é o sacrifício que importa agora, muito embora o sacrifico seja doloroso, não, é o nosso laxismo que leva a esta situação. Queremos que tratem de nós, mas que não nos incomodem. Espantoso. Falamos: “Eles, isto Eles aquilo”, deveríamos dizer, “nós vamos fazer”! Nós é que não nos importamos com quem está no governo e na assembleia. Aqui é que está a causa do nosso eterno infortúnio…

    Não sei se devo responder, se ficar calado, mas, perante esta frontalidade por parte deste desconhecido, acho que vou a terreiro também:

    - Concordo consigo. O jogo de futebol, a telenovela, o aquecedor, o ar condicionado, os chinelos, sempre foram o nosso complemento de personalidade. Continuamos mesmo assim, a ser otimistas nestes tempos.

    - Os otimistas são normalmente pessoas que não se preocupam com o que à sua volta sucede, enquanto não lhes suceder. Só que agora, como bem disse, os otimistas, e como sempre, são os mais contestatários. Se tivessem lutado em bloco, com planos lógicos e armas coerentes, tínhamos atalhado este problema na sua maior extensão… Vejamos a nível do ensino… sou professor, porque razão é que permitimos que o ministério, ao longo de trinta anos fosse cortando a parte curricular e carga horária de todos os níveis de ensino, falo no secundário, nas disciplinas que “só davam despesas”? Refiro-me, por exemplo, ao Ensino Técnico e Tecnológico. Ora o retirar sistemático de (horas curriculares e mais tarde currículos porque era impossível ministrar a mesma matéria em menos tempo e sem o material demonstrativo) ou seja, despesas a nível oficinal e laboratorial... será que deu um outro alento às finanças públicas? Talvez sim… desculpe-me, estou a abusar da sua paciência?

    - Não, não, faça favor de continuar. Tenho prazer em ouvi-lo e ao menos saber de alguém que está por dentro da matéria, qual a sua opinião, e juntar mais uma razão à razão final… Agradeço que continue.

    Pois dizia, que o diminuir de matérias lecionáveis, com a colaboração das comissões de pais, lembro-me perfeitamente na altura, que a representante dos pais a nível nacional esteve no ministério a negociar cargas horárias e currículos, nomeadamente nos cursos de eletrotecnia, eletrónica, dentro da área, não posso precisar quais os nomes dos cursos na altura… se estivesse em casa teria à mão o que aconteceu e em que cursos aconteceram os cortes, mas dizia, foram esses senhores que contribuíram, igualmente para o baixar de nível dos cursos e a sua utilidade, sempre apoiados no interior do ministério por indivíduos que, eventualmente se intitulariam como professores… não sei em que ano, ou à quantos anos não davam aulas, mas serviam as suas opiniões aos políticos para se escudarem nestas sangrias curriculares, mas dizia, não pensaram os senhores que negociaram isto para os seus filhos poderem ter tempo para se prepararem para as faculdades, com bons explicadores, esquecendo-se que os pais que habitam e labutam nas cidades mais pequenas, vilas e aldeias, muitas vezes não têm dinheiro para o almoço dos filhos na cantina. Necessitam dar aos filhos uma arma básica, breve… para entrarem no mercado de trabalho com algumas qualificações, quanto mais para pagar explicadores ou a remota entrada numa faculdade.

Bom, desculpe-me, mas como já não chove muito, vou dar mais uma corrida. Boa-noite!

Saudei-o e fiquei a pensar no que me acabou de dizer de supetão. O homem estava com isto entupido. Sem dúvida. Mas tudo o que disse é lógico, faz sentido, a ausência de exames com o objetivo de analisar as matérias dadas, sim, isto só podia redundar num contínuo fracassar do ensino… na nossa má qualidade. Os professores qualificados, aqui não têm culpa nenhuma, ao contrário do que a sociedade meteu na cabeça, ou lha meteram…

Vou andando, agora para o lado da ex-passagem de nível do ex-comboio. Uma revolução completa na cidade. Vai ser um metro superficial. Já lá vão duzentos milhões gastos… Vou agora em direção ao estádio. Ali não existem varandas que me defendam… o melhor é continuar avenida abaixo. Pelo caminho relembro o que um colega disse sobre mais uma história, a da avaliação e agora o tempo de serviço congelado dos professores. É professor, mas nunca concordou com greves sem sentido…

Meu Deus, agora cai bem. Éh, aguinha boa. Tenho que me proteger. Vamos ver se dá aqui nesta entrada deste café que já está fechado e tem esta entrada larga. Toca a correr e entrar.

- Boa noite, desculpe entrar assim desta forma… mas esta chuva apanhou-nos a todos em contra-pé.

Responde-me uma senhora de cor com uma criança de uns 8 ou 9 anos:

- Boa nôte sinhô. É vérdade mesmo. Temos chuva que dá p'ra encher bidon.

- Pois é, já é demais. Segundo dizem os entendidos os aquíferos estão já a transbordar…

- Não sei bem do que o sinhô fala, mas parece que todo o tereno já só é lama… Muito do périgoso… aquilo que aconteceu lá fora, os déslizes dos terreno e as morte…

- Aqui perto também aconteceu uma queda de uma barreira. Levou as árvores atrás de si, mas a inclinação era mais de 45%... Felizmente não aconteceu nada de maior.

- Bom, dessas coisa da porcentagem eu não sei, só que me disseram, o que o sinhô disse, foi aqui perto.

- Pois foi. Mas já está resolvido e felizmente que não aconteceram mortes.

- Isso é que é chatiação, mas a vida é assim, temos que costumar com ela.

- É verdade minha senhora, é verdade.

    - De água já chegava, até que a gente quer secar a roupa e secar o chão e fica tudo molhado, sem jeito mesmo.

    - Tem razão. Mas como a senhora disse à pouco, temos que nos acostumar com isto.

    - Lá no meu tera, não chove tanto tempo assim. Quando chove, é p’ra chovê. Quando tem calor, é que tem mesmo!

    - A senhora é de que país?

    - Da minha Angola quirida, de Luanda mesmo, nasceu, criei no bairro de São Paulo, e lá fui criando meus fiuos. Um me troxe p'ra cá e já cá estou faz 30 ano. Vou ajudando ele no que posso. Este é meu netinho e vai comigo sempre que pode p’ra casa de minha patroa, porque vem tarde e… o senhor sabe… já se me meteram… uns camundongos mesmo, nem que sendo véia. Mas quando vem meu netinho, não sê metem.

    - Sabe que isto, é complicado, há alguns anos não era assim. Podia uma senhora, uma moça andar na rua às 2, 3 da manhã, ninguém se metia e, não foi à muitos anos assim. A segurança tem vindo a degradar-se, não por falta, é até mais que nesses anos a que me refiro, mas, os valores que as pessoas tinham, perderam-se, sabe, as referências, assim o respeito pelos outros, pela sua integridade, foi-se perdendo, no caso, rapidamente e as forças de segurança não conseguem estar em todo o lado. Se nos anos referidos não existissem valores a referenciar, respeito pelo outro, como agora não há, as forças de segurança, (estou a olhar para a mulher e sinto que ela não está a entender muito bem o que digo) ou seja, a policia e os guardas não conseguiam fazer nada. Se calhar era bem pior.

    - O que o sinhô disse, me párecéu certo. O réspêito já é nada. Pode ser que para estes mininos a vida seja mais mãe que agora é… O sinhô é de cá?

    - Não sou, vivo nesta cidade, faz 40 anos, só mais dez que a senhora. A senhora trabalha numa casa de família, é?

    - Sim sinhô. Os meu patrão são professor nos facurdade de medicinas. Eu saio de casa deles por vorta das 9, 9 e méia que é quando eles vorta a casa. Faz a lida toda, come e pronto, vem embora. Hoje até que fiz um pirão que os sinhô gosta, à moda do Huambo… eles vai ficar com quecho no chão. Vai, vai!

    - Pelo que estou a ver a senhora é uma cozinheira de mão cheia…

    - Não gosto de me gabá, mas até que sou mesmo. É que minha fálécida mãe sempre me botava ná cozinha e ensinava. Se não estava com o témpéro certo ihihih, caía pau dê manga nos costado. Mulhé dura que só ela!

    - Já estou a ver que a senhora não tinha sossego. Era só a senhora na cozinha?- Não, quási sempre, mas minhas trés irmã também tinham que ver como era e espreitar p’ra ninhuma falhá, se não, comiam as quatro! Nunca sé faiou muito. Doía se faiava…

    Ouvia o que ela dizia e espreitava para a iluminação do candeeiro mais próximo e via a chuva a cair, agora não tão intensa, respondi:

    - Estou a ver que a senhora sua mãe, cuidado com ela.

    - Pois era. Ágora a gente vai. Boa notê sinhô.

    - Tenha uma boa noite também.

    Olhei a vê-la sair com o menino e a pensar que a vida, foi-me madrasta e não querendo ser o único deste “casamento”, todos os do meu país estão numa sorte, que só visto...

terça-feira, 12 de dezembro de 2023

 

SOU BANAL…




    Fugiu-me a leitura corretiva para a realidade. O meu tempo, com as personagens que criei, foi curto. Pensei sempre conseguir umas figuras que se tornassem força dentro do romance, mas… não consegui. Foram sempre parar à realidade… estranhamente.

    Das trezentas e poucas páginas de voltas com a vida das personagens, em cada cinco, estava a rever, afinal, o real. Sentado na esplanada do café, depois no seu interior fugindo à chuva e… digamos, agora no Inverno, às calamidades da invernia, as personagens passavam pela rua a todo o instante, falavam como no romance, gesticulavam como no romance, riam como no romance, passavam, a contar histórias suas, como no romance e cá dentro, ao balcão, pediam café, como no romance.

    Acho este meu romance, muito igual à realidade, a uma realidade banal. E é capaz de fazer sorrir um intelectual crítico, que ao ler a história, demonstre um carinho paternalista, cujo pensamento no momento, tenha a frase: “É tudo tão simples que nem para crónica de jornal de província serve…”

    Penso isso? Não sei se penso isso. Porque razão é que a história das pessoas simples, com rasgos de humor, rasgos de bondade, rasgos de heroicidade, rasgos de sacrifícios, de ternura, de dádiva… é banal? Porque razão o aroma de uma rosa é banal? Porque razão o aroma e o sabor de uma maçã bravo de Esmolfe, é banal? Porque razão todos os gritos de angústia são banais? Porque razão os gritos de esperança, são banais? Porque razão os afetos são banais? Porque razão a forma de fazer sexo é banal?

    Porque razão se convencionou que a retórica sustentada em demagogias é o futuro? Porque razão se convencionou que um discurso vazio de realidade, sustentado em premissas meramente académicas, é o futuro? Porque razão se convencionou que a dinâmica da ficção nunca deve ser simples, sim complexa, baseada numa ideia complexa que interrogue? Porque razão o futuro que nos querem dar, é o presente camuflado? Só que não aconteceu ainda...

    Porque razão estamos, complexamente, enganados quanto ao futuro? Porque razão é já tão banal apresentarem-nos a incompetência em forma complexa? Porque razão a dor de saber, de pagar, de continuar a sofrer, afinal lhes é tão simples, basta aumentar-lhes o salário? Porque razão é banal, neste país, ser-se simples? Porque razão a história dos simples, dos seus afetos, do seu amor, dos seus laços de ternura, da sua heroicidade, da sua capacidade de sofrimento é uma forma de pagar, repagar, voltar a pagar os erros clamorosos dos “gestores de conta do país”, isto é banal?

    O ser simples e banal é aceitar o outro tal como é. Ser simples e banal é ajudar a pagar os erros de poucos para o bem de todos. O ser simples e banal é contribuir para o bem comum. O ser simples e banal é amar, ser amado, ter capacidade de gerar futuro. O ser simples e banal é acreditar, ter esperança e lutar pelo futuro. O ser simples e banal é ser um povo.

    Ninguém, até que vindo do seio desse povo, pode retirar-lhe a honra e a sua dignidade, quando isso lhe cabe, inteiramente por justiça! Quero um governo banal e um presidente da República, banais!

… E as figuras deste novo romance agigantam-se na sua simplicidade. Irei escrever mais e mais sobre as “banalidades” deste meu povo, donde sou!




Victor Martins

terça-feira, 20 de junho de 2023

                                    Voltaram a dizer-nos para continuarmos este nosso "sitio". Pois bem, a nossa opinião vai contar então para os nossos leitores amigos. Começaremos então com esta nossa opinião... em jeito poético... mas que para nós é o que sentimos...



PÁTRIA MINHA

 

 

A minha pátria é como se não o fosse...

Apesar de íntima, de estar na essência do que sou, dá-me vontade de chorar.

Apesar de tudo é a minha pátria.

Mas não é.

Por vezes, não tão poucas, dou comigo a meditar sobre si

e vem ao meu pensamento: “Que saudades tenho da minha pátria”.

Ah, não me venham com perguntas sobre: Afinal qual é a tua pátria? O que é a tua pátria? Porque te faz chorar?

Pois… não sei.

Defacto não consigo saber responder mesmo sabendo a resposta.

A minha pátria tem tudo. É água é vento, é fogo, é sal é ternura é vida, é afeto!

Sinto vontade de a beijar com sofreguidão, chorando sobre o seu rosto, lágrimas amargas

de quem pressente que ela está ali. E está, porque a sinto afinal.

Mas… a minha pátria tinha vestidos de brocado, de seda, de veludo… 

a minha pátria tinha uns cabelos bonitos, umas vezes longos e dourados, outras vezes curtos e encaracolados… eram escorridos… e com caracóis, mas sempre brilhantes, lindos.

Os sapatos eram esplendorosos e faziam a minha pátria voar sobre as nuvens chegando sempre a todos os seus filhos.

Aquelas pequenas asas ficavam-lhe tão bem. Davam-lhe um voo rápido.

Agora é pobre... está descalça e tem os vestidos rasgados… vejo o tecido quase transparente de tão usado, que lho deram por esmola quando lhe cabia o brocado por justiça!

Foi aqui, faz pouco tempo, que soube que o Infante afinal era surfista e tinha uma escola de barcos para regatas lá para os lados de Sagres… Estás e tratam-te tão mal…

Mas, pátria minha, continuas a ser o mel dos meus dias, apesar de seres agora muito, muito pobre. Colocaste  uma flor no teu cabelo... tão mal tratado.

Essa flor exala para o ar um aroma infinitamente doce e terno, capaz de tudo.

A minha pátria tem os seios desnudos porque já não tem tecido para proteger o efeito da gravidade que se espalha por todos os cantos desta pátria que se tornou amarga e desgrenhada e nos faz despenhar lentamente.

Até o vento, a chuva e especialmente o fogo, perderam o respeito por ti pátria amada.


Victor Martins


  AS COISAS QUE EU PENSO...      Tal como na vida, nada é tão simples como a entrada (nascimento) de um partido, ou coligação, na go...