quarta-feira, 24 de setembro de 2025

 

PATRÃO É CAMPEÃO, MATA TUDO,

 

 

          Fizeram-me um pedido, estranhei porque o “sitio” onde escondi a minha caixa de correio, afinal, está “visível”. Como nos descobrem os “locais” onde conversamos, com quem queremos? Descobriram mesmo? Bom, afinal não é por aí que vem mal ao mundo. Perguntaram-me, se nesse meu “”, (Angola) sobre as histórias que ficaram impressas nesse meu livro, produzido a “expensas próprias”, tinha mais histórias. Dei aos “perguntadores” umas notas. Por via disso, agora, para todos os leitores, vai uma historinha, que nos fez rir, na altura. Começou, e resumidamente, vai assim:

…………………………………………………………………………..

Estou a sair de casa no Cubal para ir até à fazenda do Franklim, comemorar os anos do pai. A minha família entra no carro. Abro o porta luvas para ver se tinha os documentos do carro e vejo um papel dobrado, este não estava na minha alçada, fazia tempo... Peguei-lhe e a mulher diz que o tirou de um livro que estava numa estante. Pergunta-me quando é que eu tinha escrito o poema. Desdobrei o papel, li e sorri. Respondi que tinha sido em Luanda. A inspiração surgiu de uma “quitandeira” que solicitava a uns rapazes a compra de uns doces que ela confeccionava. Escrevi-o assim:

“ Ai ué minino, Mi compra caramelo.

Ai di mim, precisa dinhéro

Pa dá a meu fiu piquinino

Comida, e comprá meu chinelo Qui já estragou todo intéro...

Ai ué... mi compra meu caramelo... Já foi na Mutamba,

E no São Paulo já foi. Vai tê quir no quimbanda,

Quê sorte minha só doi.

Ai ué minino,

Mi compra meu caramelo…”

 

A mulher diz-me:

- Sensibilidade para “agarrar” o lamento da quitandeira. Noto que continuas assim, “deo gracias”.

Quando cheguei à fazenda, já o Matos e o Borges se encontravam com as famílias. Notei, notámos, que Franklin andava “derrancadinho” para sair, queria ver se caçava uma onça. É que lhe tinham garantido a pés juntos que andava uma a rondar a fazenda todas as noites. O vício dele era tal…

Bom, Fanklin às vezes contava umas histórias que mais mos pareciam anedotas. Porquê? Sabe-se lá. Foi essa a informação que teve. Onça na “costa”.

Dizia então Franklin, que por vezes, aqui sabíamos ser verdade, ia à noite caçar uma ou outra cabra, aproveitando para verificar as extremas da fazenda, ver o gado que os pastores deixavam acomodado no mato, etc., e que até  tinha visto pistas de onça…

Tanto andou que conseguiu que o desculpassem, tamanho era o vicio da caça, a ausência dele, seria de mais ou menos, uma hora no máximo, dizia. Saiu com o inseparável, capataz e guia de caça, o Tavongo.

Estava uma bela noite e por acaso não o vimos sair com a arma na “mão”, já a tinha no estrado do jeep. Seguiu.  Depois de algumas voltas dadas, quem lhe aparece vindo “do nada”? O fiscal bem conhecido de todos nós. O homem, tal como todos, vivia no Cubal. Aparece-lhe silenciosamente, o que era inacreditável para quem conhece o Franklin. Este fiscal era um sujeito que farejava o pessoal, tinha um “andar” de onça, como o Borges dizia.

Seria perto da meia noite e meia. Estava Franklin numa extrema da fazenda com o Tavongo a seu lado. Franklin tinha combinado com o seu “braço direito”, antes que um qualquer fiscal chegasse junto deles, e que perguntasse se o patrão estava a caçar, ou se matava muita caça, devia dizer que não. “Olha Tavongo, defende-me! Diz sempre que não!” O fiel “escudeiro” sabia como se comportar.

Chegou o fiscal junto deles, cumprimentou e começou um interrogatório disfarçado. Ia sabendo o que lhe interessava e a determinada altura, dispara:

- “Então e o farolim no jipe, é só para ver melhor o mato, não é, senhor professor?” Franklin ia respondendo:

- “O senhor sabe bem que não é, mas também sabe que tendo gado a pastar por todo o lado, necessito por vezes saber onde os animais pernoitam. Ver se tudo está bem. É claro que não vou para perto deles ver. Ligo o farolim e vejo bem o que se passa”.

E o fiscal continuava:

- “Pois claro que é assim, nem uma arma o senhor trás, pois não?”

- “Tenho sim senhor! Também sabe que tenho armas e legalizadas. Preciso me defender, se alguma vez uma onça me ataque, sabe que por aqui há muitas. Também sabe que tenho tudo legalizado.” - Respondia Franklin.

- “Muito bem. - Brincava o fiscal - Toda a gente sabe, nas redondezas, até os seus empregados o dizem, que o senhor não percebe nada de caça e é um mau atirador, que não acerta sequer num elefante, nem a dois metros.”

Aqui Tavongo, furioso, entra num repente na conversa e exclama:

- “ Não sinhôr, não é vérdáde! O pátrão és cámpião, máta tuto!”

Franklin ficou sem pinta de sangue.

O fiscal desata à gargalhada. Achou graça à defesa que o capataz estava a fazer do patrão, e, carros leitores, não o multou. Teria por base o “depoimento” da “testemunha”, que afirmou peremptoriamente que o patrão caçava mesmo. Franklin, primeiro com riso amarelo, mas depois num riso franco. leva o fiscal para a fazenda, beber uns uísques. Regressamos todos ao Cubal incluindo o fiscal.

 

Acabou assim a historinha… A simplicidade das “coisas” cria afectos, cria… sorrisos, cria entre nós… é, cumplicidade sorridentes.

 

 

VM

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